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Fazendas urbanas – Novo negócio surge nas cidades

Autores

Fábio do Nascimento Lima
Engenheiro agrônomo – Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro)
fabionaslim@outlook.com
Fabiano Pacentchuk
Engenheiro agrônomo, mestre em Produção Vegetal e doutorando em Agronomia – Unicentro
fabianopacentchuk@gmail.com
Itacir Eloi Sandini
Engenheiro agrônomo, doutor e professor do curso de Agronomia – Unicentro
isandini@hotmail.com

O conceito de fazenda urbana descreve um modelo de negócio que envolve o cultivo intenso e protegido de hortaliças, frutíferas, e em alguns casos até a piscicultura em área urbana. O conceito foi formado por meio de estudos científicos em microbiologia e segurança alimentar no final da década de 1990.

Entretanto, o estabelecimento desta técnica começou a se estabelecer a partir do ano de 2010, com representatividade em países de economia desenvolvida, e estimulado por problemas como escassez de terras, como no Japão e Cingapura, e por problemas de abastecimento alimentar provocados por questões climáticas no Canadá e no leste europeu (Amaral, 2018).

Essencialmente, são duas as formas de produção agrícola identificadas nas fazendas urbanas – produção horizontal e vertical. A produção horizontal constitui-se da aplicação do método convencional, que faz uso de solo em locais vazios urbanos, espaços públicos e privados, coberturas de edifícios, em ambiente aberto ou protegido.

Por outro lado, a produção agrícola vertical faz uso de técnicas com o objetivo de sobrepor a produção na mesma área, ou seja, intensifica a produção por meio do uso do espaço aéreo sobre o solo (Amaral, 2018).

Grandes empreendimentos

São vários os exemplos de agricultura urbana pelo mundo, alguns inclusive se tornaram grandes empreendimentos. A primeira fazenda vertical tropical foi implantada em Cingapura em 2012, chamada de Sky Greens, um sistema patenteado composto de 38 linhas de plantio, com estrutura que produz vegetais diversificados e que pode atingir até nove metros de altura.

Segundo a Agritecture (2017), as dez maiores empresas que incentivam a expansão de fazendas verticais são: Freight Farms (EUA); AeroFarms (EUA); BrightFarms (EUA), Edenwoeks (EUA); Detroit Dirt (EUA); SproutslO; Fujitsu (Japão); Grove Labs; Garden Fresh Farms; e Growtainer (EUA), denominadas âncoras no setor, em âmbito mundial.

Mais recentemente o tema começou a ser discutido no Brasil, no meio acadêmico principalmente. Os principais aspectos incluem: os elevados preços da terra; as vantagens e riscos da reutilização de águas e dejetos urbanos; a segurança alimentar e os riscos de exposição a contaminantes urbanos; a necessidade de adaptar e intensificar a produção em condições de restrição de espaço; as oportunidades para as agroempresas acessarem os mercados mais próximos, combinando múltiplas funções; a inclusão social; e a necessidade de se envolver com regulamentações, políticas e planejamento ambiental de maior complexidade e que têm, muitas vezes, um caráter intrusivo e restritivo com relação à atividade (Dubbeling & de Zeeuw 2007).

Sustentabilidade

Por meio da sofisticação tecnológica, a forma de produção em fazendas urbanas, via de regra, permite a utilização de 95% menos água do que a produção agrícola no campo, e com potencial de rendimento em torno de 130 vezes maior por metro quadrado anualmente (Aerofarms, 2015).

No Brasil, dificilmente se atingirá tal produtividade por área com retorno financeiro, pois requer grande investimento na implantação e em iluminação artificial. Por outro lado, em várias cidades há uma excelente incidência de insolação natural, a qual deverá ser aproveitada para reduzir custos.

No Brasil, o município com maior representatividade é São Paulo (SP). São 441 unidades produtivas, nas quais atuam diretamente 1.271 pessoas (Avilaverde, 2016). Essa atividade é estimulada pelo programa de agricultura urbana e periurbana, apresentada na Lei n° 13.727 de 2004, e no decreto n° 51.801 de 2010, que estabelecem vários benefícios para produtores em meio urbano, como a redução do IPTU e a prioridade na compra de produtos do programa de abastecimento de instituições públicas, entre outros.

Mais com menos

Esse novo modelo de produção caminha em paralelo com inovações tecnológicas com grande quebra de paradigmas econômicos que ocorrem no século XXI. Tecnologias como a robótica, inteligência artificial e biotecnologia têm mudado a produtividade agrícola, entretanto, a inovação tecnológica sem mercado é apenas uma boa ideia sem aplicação.

As fazendas urbanas buscam tornar mais eficiente a produção agrícola protegida e adensada, pelo emprego de novas tecnologias (Amaral, 2018). Para Despommier (2013), uma fazenda vertical equivalente a 1,0 ha e 30 andares poderia fornecer alimentos para atender as necessidades de 10 mil pessoas.

Além da agricultura vertical fornecer alimento suficiente, garante um ar mais fresco, gera empregos e reduz a extensão e a complexidade da cadeia de abastecimento dos produtos, trazendo ao consumidor vegetais mais frescos e sustentáveis, bem como essas se tornam belas paisagens arquitetônicas.

Outro ponto que impulsiona esse tipo de negócio são as tecnologias digitais, que aproximam fornecedores de consumidores e possibilitam a redução do custo de logística, que torna o processo com maior automatização. Costa et al. (2017) afirmam que as fazendas verticais localizadas em áreas urbanas tornam a produção agrícola um sistema integrado, pois o alimento é cultivado, transportado e consumido na própria área urbana, o que reduz emissões de poluentes decorrentes do transporte dos alimentos, além do melhor aproveitamento do espaço urbano.

Desafios

Há um crescente interesse entre pesquisadores, planejadores, designers e empresas que desenvolvem infraestruturas pela agricultura vertical, pois é uma alternativa inovadora e encaixa-se bem no conceito de economia verde circular. Devido a esse alto nível de interesse, as estruturas, os projetos e as tecnologias desenvolvem-se rapidamente (Schans et al. 2014).

Apesar desse interesse, são poucos os conceitos planejados e executados, e ainda existem muitos desafios a serem superados, como o custo relativamente elevado do investimento, em comparação com os alimentos cultivados horizontalmente a céu aberto, pois os terrenos em área rural são mais baratos quando comparados aos da área urbana.

Além disso, há também os custos com energia. Investimentos maiores elevam os preços dos produtos, o que levanta questões críticas sobre a acessibilidade social da produção e a rentabilidade desta (Schans et al. 2014).

Ainda são poucas as pesquisas relacionadas ao impacto ambiental dessas construções e à necessidade de uso de energia para criar e manter esses ambientes controlados. Provavelmente, para se alcançar os potenciais benefícios ambientais existe a necessidade de utilizar fontes alternativas de energias, como a energia solar, o que pode exigir investimentos adicionais significativos.

Questões importantes ainda devem ser discutidas, como novas formas de organização e abordagens para a gestão das instalações e do zoneamento urbano devem ser desenvolvidas antes que a agricultura vertical possa expandir como uma indústria integrada ao meio urbano.

Outro fato importante é a inclusão social da agricultura vertical, pois como já é sabido, a tecnologia pode aumentar a oferta de alimentos saudáveis e sua disponibilidade para residentes urbanos, bem como reduzir preços, pelo menos em teoria (Schans et al. 2014).

Na prática, as abordagens de mercado high-end podem dominar, pois os investimentos precisam retornar aos investidores. A agricultura vertical pode se favorecer de experiências de outras indústrias, onde os negócios baseiam-se nem tanto na propriedade da tecnologia, mas sim na sua utilização (Schans et al. 2014). Ou seja, nesse cenário os empreendimentos de agricultura vertical poderiam ser conduzidos e gerenciados por terceiros. 

Viabilidade

Para que a agricultura vertical possa se tornar uma realidade viável, ainda há a necessidade de se desenvolver modelos de negócios organizacionais específicos, que podem variar desde iniciativas comerciais para o mercado até iniciativas de empreendedores sociais que visam integrar o sistema em abordagens mais comunitárias (Amaral, 2018). Modelos como esses, num contexto de inovação, são assunto para um debate crescente.

A agricultura urbana, apesar de ser uma alternativa com potencial produtivo e com boas perspectivas, exige compreensão da viabilidade econômica, de acordo com a capacidade de geração de renda atrelada ao sistema produtivo e ao ambiente. Ainda sem implantação significativa no Brasil, é necessário compreender e analisar experiências em outros países, como exemplos de fazendas verticais que estão consolidadas ao redor do mundo, especialmente na Ásia, Rússia e EUA.


RETRANCA

BeGreen Boulevard

Arte agrícola sobre um shopping

A BeGreen Boulevard, localizada dentro do Boulevard Shopping, em Belo Horizonte (MG), é uma dessas obras de arte que mudam o cenário nas cidades. Com uma área produzida de 1.500 m², a ideia surgiu quando Giuliano Bittencourt, visitou o projeto Agtech, do Massachusetts Institute of Technology, e viu de perto uma tecnologia de altíssima qualidade para a produção de hortaliças em espaços fechados. Pensando nesse modelo, ele decidiu adaptar à realidade brasileira, com o uso de tecnologias mais acessíveis para uma criação mais confiável e eficiente.

A BeGreen foi a primeira fazenda urbana no Brasil, considerando uma área de produção de tal porte e a capacidade de gerar as próprias mudas do processo produtivo dentro da área da fazenda. Atualmente, a produtividade da fazenda é de 28 vezes mais por metro quadro que uma fazenda convencional, dentre hortaliças, temperos e folhosas, além de microgreens.

Ricardo Mortara Batistic, engenheiro ambiental e CTO da BeGreen, conta que lá são produzidas as alfaces Salanova, além de espinafre, cebolinha, basilicão, dentre outras, que são cultivadas o ano inteiro, visto que há a estufa que mantém as condições de temperatura, umidade e luminosidade dentro dos parâmetros produtivos para que as plantas estejam na maior parte do tempo em condições ideais.

Nada convencional

Ricardo relata que a produção na fazenda urbana tange o que se vê numa fazenda rural, porém, de formas totalmente não convencionais. “A começar, plantamos em sistema de aquaponia, um sistema que mistura aquacultura (produção de animais aquáticos, no nosso caso tilápias) e hidroponia (plantio com o uso de água, e não de terra). Nossas mudas são todas produzidas na própria fazenda, com o uso de um sistema de germinação que nos permite desenvolvê-las até atingirem o estado de maturação suficiente para o transporte para o sistema de produção principal”, detalha.

São muitos os benefícios da técnica, a começar pelo fato de estar no meio da cidade, o que permite uma logística de transporte para os restaurantes atendidos de poucos quilômetros, se comparado com a distância das fazendas rurais, reduzindo muito o desperdício de alimentos pela cadeia de transporte e os impactos ambientais da atividade.

Além disso, por produzir em aquaponia, reduz-se em até 90% o uso da água para a produção de alimentos, além do controle de produção maior e com mais tecnologia, o que garante mais eficiência de produção.

Contra pragas e doenças

Na BeGreen são usados produtos certificados para a agricultura orgânica no combate às pragas, como o óleo de neem, bactérias que combatem fungos, fungos que combatem fungos, mas não prejudicam as plantas ou os consumidores, e outros produtos de semelhante função. “A boa colheita é feita com o acompanhamento criterioso de todas as atividades que permeiam o ciclo produtivo das plantas, com resolução de problemas da forma mais rápida possível, além de usar os melhores insumos e fazer o controle de qualidade da água utilizada”, afirma Ricardo.

Quando questionado sobre a aposta no empreendimento, ele responde que é preciso pesquisar muito antes de começar qualquer atividade: “não existe uma fórmula mágica que dê certo para todos. Conheça o mercado, verifique as possibilidades e se certifique que a atividade é realmente o que você gostaria de fazer, com empenho e afinco. Seja hobby ou atividade comercial, a agricultura urbana também exige tantos ou mais cuidados que aqueles observados nos campos, e caso não exista o empenho necessário, a produção tende a ter resultados provavelmente não agradáveis”, alerta.


RETRANCA 2

Fazenda Urbana Brasil

A primeira em ambiente controlado da América do Sul

A Fazenda Urbana Brasil, localizada no Rio de Janeiro (RJ), apostou nos microverdes em cinco níveis de produção dentro de um container marítimo. A colheita acontece duas vezes por semana, 52 semanas por ano.

Rodrigo Meyer, Glaucio Genuncio e Thomas Oberlin são os fundadores, e contam que trabalham com o sistema SmartFarm de ambiente controlado, possibilitando produzir até 40 mil unidades por mês dentro de um container marítimo de 12 metros. “Cada container pode gerar mais de R$ 400 mil por mês em receita”, revelam.

Atualmente, são cultivadas mais de 30 tipos de plantas, e são comercializados regularmente 15 produtos, incluindo: golden onion, alho-poró, pink flamingos, rúcula, couve-manteiga, purple kohlrabi, pepper cress, summer cress, repolho roxo, mostarda, rabanete, cenoura e várias misturas.

“Nunca há um momento ruim para plantar na Fazenda Urbana em ambiente controlado. Este é o segredo do sistema que desenvolvemos. Nós controlamos a temperatura, umidade, luz, água e tudo que poderia afetar a vida dos microverdes. Assim, todo dia é um dia perfeito para plantar e colher. Como operamos dois ciclos de colheita por semana, temos um processo de produção altamente coordenado. E como somos a primeira fazenda vertical de ambiente controlado da América do Sul que se concentra em microverdes, desenvolvemos ferramentas e processos proprietários. Essas ferramentas e processos reduziram muito nossa dependência do trabalho manual. Além disso, como nós dois (sócio-fundadores) temos experiência no setor de TI, aplicamos a tecnologia IOT e usamos coleta de dados e análise de dados para otimizar nossa produção”, conta Rodrigo Meyer.

Sem perdas

Mais de 35% das frutas e legumes são perdidos no transporte da fazenda para o mercado. Longas distâncias com transportes nem sempre refrigerados em um clima quente e úmido em grande parte do Brasil são responsáveis por grande parte dessa perda.

A Fazenda Urbana Brasil reduz essas perdas produzindo alimentos perto do consumidor. Além disso, produção próxima ao consumidor é igual a alimentos mais frescos, com menos desperdícios e maior valor nutricional.

A Fazenda Urbana Brasil não tem problemas com pragas e doenças e utiliza sementes sem defensivos. “As sementes são lavadas e depois plantadas em substrato natural esterilizado. E nós germinamos e produzimos em um ambiente totalmente controlado. Usamos água purificada. Sem agrotóxicos, sem fertilizantes, portanto, nossos produtos são mais limpos que os certificados orgânicos. E também são 100% veganos”, orgulha-se Thomas Oberlin.

Ainda segundo ele, para se arriscar nesse negócio é preciso, primeiro, considerar a disponibilidade de alimentos frescos na região, os tipos de cultivos, preços e demandas. “Quem é o consumidor? Depois deve-se escolher uma área com disponibilidade de água de boa qualidade e energia. Com isso, deve-se definir o tipo de manejo, que pode ser convencional, orgânico, hidropônico (para atender demandas específicas do mercado consumidor vegano) e outros. Conseguir bons relacionamentos com fornecedores é essencial, como produtores e fornecedores de sementes sem agrotóxicos, que apesar de mais caras, valem o investimento. Finalmente, o entendimento e implementação da rede de distribuição na sua região ou cidade é um ponto que pode tornar a fazenda lucrativa ou não”, ensina.

Tecnologia avançada

A Fazenda Urbana Brasil usa um processo e sistemas inovadores para cultivar os microverdes MightyGreens perto de grandes centros populacionais. Começou no Rio de Janeiro e agora está expandindo para São Paulo. Suas fazendas são configuradas para que possam ser monitoradas e controladas remotamente, reduzindo o custo de mão de obra e as perdas de produção. “Como controlamos completamente o ambiente de produção, nunca precisamos usar nenhum agrotóxico”, conta Rodrigo Meyer.


BOX

Tecnologia do começo ao fim

MightyGreensTM é uma marca da Fazenda Urbana Brasil, a primeira empresa com uma fazenda vertical de Agricultura em Ambiente Controlado (CEA) no Brasil. A CEA é uma abordagem baseada em tecnologia para a produção de alimentos, e tem por objetivo proporcionar proteção e manter condições ideais de crescimento ao longo do desenvolvimento da cultura.

A produção ocorre dentro de uma estrutura fechada. As plantas são cultivadas usando métodos hidropônicos ou aeropônicos para fornecer quantidades adequadas de água e nutrientes para a zona da raiz. A CEA otimiza o uso de recursos como água, energia, espaço, capital e mão de obra.

 A Fazenda Urbana Brasil produz em contêineres marítimos convertidos com tecnologia de última geração. Cada um pode produzir a mesma quantidade de vegetais que 0,4 ha de terra. Os contêineres contam com sensores e tecnologia para controlar luzes, temperatura, umidade relativa, bombas e nutrientes. Com o controle preciso, as plantas podem crescer rapidamente, sem pesticidas, insetos, poluição e doenças, sendo melhores que os orgânicos.

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