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1ª etapa de um canavial com longevidade e altas produtividades

Autores

Renato Passos Brandão
Gerente do Deptº Agronômico
Rafael Bianco Roxo
Gerente Técnico Regional – São Paulo e Sul de Minas
José Renato Otávio
Trainee do Deptº Agronômico

Fotos: Shutterstock

Um dos maiores problemas de fertilidade dos solos brasileiros é a acidez elevada. Portanto, a reação do solo é o primeiro fator que precisa ser conhecido em um talhão a ser cultivado com cana ou nas soqueiras.

Em solos ácidos de regiões tropicais, a deficiência de cálcio e a toxidez causada pelo alumínio são os fatores que mais têm limitado a produtividade das culturas. A acidez do solo e aquela localizada nas camadas subsuperficiais, em caso de níveis tóxicos de alumínio e/ou deficiência de cálcio, notadamente comprometem a penetração das raízes e a nutrição das plantas, predispondo as culturas ao estresse hídrico (Caires, 2014).

Os solos ácidos possuem pH abaixo de 7,0. Normalmente, os solos brasileiros possuem pH entre 4,0 e 7,5, predominando, em sua maioria, os solos ácidos. Em algumas regiões do semiárido nordestino ocorrem solos com pH acima de 7,0.

Os solos podem ser naturalmente ácidos, causados pelos baixos teores de bases do material de origem (Ca, Mg e K) ou pelas condições de pedogênese ou de formação do solo, favorecendo a remoção dos nutrientes básicos. As regiões tropicais com alta precipitação, normalmente possuem solos mais ácidos que regiões com menores precipitações.

Além disso, os solos podem ter a acidez aumentada por cultivos sucessivos e adubações, que conduzem às perdas de cátions básicos. Em sistemas de cultivo intensivo – dentre os quais a cana – a principal causa da acidificação dos solos é a utilização de fertilizantes acidificantes no solo, principalmente os nitrogenados. O sulfato de amônio é um dos fertilizantes mais acidificantes do solo. Para a neutralização da acidez gerada por 1,0 t de sulfato de amônio são necessários cerca de 1,1 t de calcário com PRNT de 100% (Malavolta, 1987).

Correção da acidez do solo

A calagem é uma prática cultural que consiste na aplicação de quantidade necessária de corretivos agrícolas para a neutralização da acidez do solo, elevando o pH de uma condição inicial para uma condição desejada (Raij, 1983).

Os materiais mais utilizados na calagem são os calcários calcíticos e dolomíticos. Outros corretivos da acidez são a cal virgem agrícola, a cal hidratada agrícola e a escória básica de siderurgia (Malavolta, 2006).

A aplicação de calcário na superfície sem incorporação cria uma frente de correção da acidez do solo em profundidade, proporcional à dose e ao tempo de aplicação do calcário (Caires et al., 2005). Segundo esses pesquisadores, a reaplicação superficial do calcário em solo já corrigido com calagem na superfície do solo pode facilitar a movimentação do calcário em direção ao subsolo e proporcionar amenização ainda mais acentuada na acidez do perfil do solo.

A reaplicação de 3,0 t/ha de calcário sobre as parcelas que já haviam recebido calcário (6,0 t/ha) ocasionou aumento mais acentuado no pH até a profundidade de 60 cm, do que o tratamento que havia recebido apenas 6,0 t/ha de calcário, indicando que houve movimentação do calcário reaplicado na superfície para maiores profundidades do solo, quando a acidez na camada mais superficial era mais baixa (Caires et al., 2008).

Resultado similar foi obtido por Noble e Hurney (2000) em cana na região tropical úmida da Austrália. No início do experimento foram aplicadas 5,0 t/ha de calcário e a dose do calcário foi repetida mais três vezes num período de 18 meses. Os aumentos de produção de cana devido à calagem eram evidentes até os 18 meses do início do experimento.

Os autores observaram reduções progressivas da acidez trocável no subsolo, acompanhadas de aumentos nos teores de cálcio e magnésio a uma profundidade de até 100 cm (Quaggio; Raij, 2008).

Segundo Caires (2014), os prováveis mecanismos que podem estar envolvidos na amenização das condições de acidez em subsuperfície por meio da calagem na superfície do solo em sistemas de plantio direto são: (i) formação e migração de Ca(HCO3)2 e Mg(HCO3)2 para as camadas mais profundas; (ii) deslocamento vertical de partículas finas de calcário mediante o movimento descendente de água, em razão de condições favoráveis de estruturação do solo. (iii) mobilização química do calcário nas formas inorgânicas, principalmente com sais de nitrato e sulfato, e orgânicas.

Em sistema de cultivo que proporciona acúmulo de matéria orgânica na camada superficial (0 – 2,5 cm), pode ocorrer a formação do complexo Ca-fulvato, fração orgânica do cálcio muito estável, permitindo uma liberação do cálcio muito lentamente, enquanto o complexo desce no perfil do solo (Watt et al., 1991).

Benefícios da calagem

De maneira geral, as raízes das plantas cultivadas comercialmente não se desenvolvem bem em solos ácidos devido ao excesso de alumínio e/ou à deficiência de cálcio. O alumínio afeta o desenvolvimento das raízes, reduzindo o seu alongamento e causando alterações morfológicas. O excesso de alumínio no solo prejudica a absorção e o metabolismo dos nutrientes pelas plantas, principalmente do nitrogênio, fósforo, cálcio e magnésio (Furlani, 1989).

Estratégia para a correção da acidez dos solos em cana

Resultados práticos têm demonstrado que a calagem em soqueiras de cana aumenta a produtividade e expande a vida útil do canavial em pelo menos mais um corte, sendo suficiente para viabilizar economicamente essa prática.

A calagem em soqueira também contribui para manter o subsolo em melhores condições para o desenvolvimento da cana-planta na reforma do talhão (Quaggio; Raij, 2008). Atualmente, há dois métodos de calagem para a cultura da cana: método da saturação por bases e o método da elevação dos teores de Ca e Mg nos solos.

Método da elevação dos teores de Ca e Mg

Benedini e Korndorfer (1992) propuseram um método para o cálculo da calagem em cana baseado nos teores iniciais de cálcio e magnésio do solo e nas prováveis perdas desses nutrientes pelo solo estimadas durante o ciclo da cana, conforme equação abaixo.

NC = [30 – (Ca +Mg)] x 100

                 PRNT

onde:

NC = Necessidade de calcário a 25 cm de profundidade em t/ha

Ca e Mg = Teores dos nutrientes no solo em mmolc/dm3

PRNT = Poder relativo de neutralização total do calcário

O valor 30 foi obtido da soma dos valores críticos de Ca e Mg no solo, estimados pelos pesquisadores para a cultura da cana em 14 e 9,0 mmolc/dm3, respectivamente, mais um adicional de 7 mmolc/dm3, que estima as perdas dos nutrientes por lixiviação de bases.

Método da saturação por bases

O método da saturação por bases é o mais utilizado para a recomendação de calagem em cana-de-açúcar. Este método preconiza a elevação da saturação por bases do solo a valores pré-estabelecidos levando-se em consideração a cultura e o solo. Envolve parâmetros químicos e físico-químicos do solo, como a capacidade de troca catiônica (CTC), a soma de bases (SB) e a saturação por bases (V).

Recentemente, as recomendações de calagem para a cana foram adaptadas e preconizam a elevação da saturação por bases (V%) a 70%, quando for inferior a 60%. Manter o teor de magnésio no solo igual ou superior a 9,0 mmolc/dm3.

Em cana-planta, a calagem visa corrigir a camada do solo de 0 a 20 cm.  Se o preparo do solo for um pouco mais profundo, é importante calcular uma dose maior de calcário. Em solos com baixa capacidade de troca catiônica (CTC), a dose recomendada de calcário pelo método da saturação por bases não é suficiente para a elevação do teor de Mg no solo para a faixa adequada à cultura da cana.

Manejo da calagem

Realizar o cálculo da necessidade de calagem utilizando os dois métodos, aplicando-se a maior dose de calcário. Em solos com baixa CTC (< 45 mmolc/dm3), normalmente arenosos, com baixos teores de matéria orgânica, o método da elevação dos teores de Ca e Mg recomenda doses mais elevadas de calcário do que o método de saturação por bases.

Em cana-planta, a dose máxima de calcário é de 5,0 t/ha, elevando o teor de Mg para 9,0 mmolc/dm3. Nas soqueiras, a dose máxima de calcário é de 3,0 t/ha, elevando o teor de Mg para 9,0 mmolc/dm3. Se a dose calculada for superior, aplicar o restante no ano seguinte.

Em solos com baixo poder tampão (baixa CTC), utilize calcários com menor PRNT, visando um maior efeito residual. Em soqueiras, sem a incorporação do calcário, os efeitos da reaplicação do calcário ficam restritos à camada superficial do solo (0 a 5 cm ou 0 a 10 cm). Em solos com menor poder tampão – solos mais arenosos – os efeitos da calagem podem atingir uma profundidade ligeiramente maior.

Efeitos desejados

Em muitas situações, a incorporação inadequada do calcário no solo não permite a reação integral do corretivo. O calcário possui baixa solubilidade em água (0,016 g/L) e a reação só ocorre com o seu contato com o solo.

A acidificação do solo é um processo contínuo, havendo a necessidade da reaplicação do calcário. A acidez provocada pelos fertilizantes, notadamente os nitrogenados, é significativa.

Magnésio em cana

O magnésio é constituinte da clorofila (2,7% do seu peso molecular), sendo o átomo central deste pigmento o cloroplasto, onde ocorre a fotossíntese das plantas. Cerca de 50% do magnésio nas folhas encontra-se nos cloroplastos.

A deficiência de magnésio ocasiona a diminuição na síntese de clorofila e, consequentemente, na taxa fotossintética, reduzindo o potencial produtivo da cana. Consequentemente, ocorrerá também redução no ATR da cana.

O magnésio é o nutriente que ativa o maior número de enzimas nas plantas, dentre as quais as relacionadas à síntese de carboidratos. O baixo suprimento de magnésio no solo pode comprometer o fluxo de carboidratos das folhas para o colmo, prejudicando o ATR da cana.

A adubação foliar com o Mg na fase de maior desenvolvimento vegetativo aumentou a produtividade da cana-soca (Figura 1). O aumento na produtividade da cana-soca foi 9,05 t/ha.

A vinhaça aplicada nas doses utilizadas pelas usinas tende a aumentar significativamente o teor de K no solo, reduzindo a disponibilidade e a absorção do Mg pela cana-soca – inibição competitiva.

Considerações finais

A calagem é a prática inicial visando a construção da fertilidade do solo. Em solos ácidos de regiões tropicais, a deficiência de cálcio e a toxidez causada pelo alumínio são os fatores que mais têm limitado a produtividade das culturas. A acidez do solo e notadamente aquela localizada nas camadas subsuperficiais, em caso de níveis tóxicos de alumínio e/ou deficiência de cálcio, comprometem a penetração das raízes e a nutrição das plantas, predispondo as culturas ao estresse hídrico.

A produtividade da cana é tanto maior quanto maior for o volume do solo explorado pelas raízes, pela maior extração de água e nutrientes. A calagem altera os atributos químicos do solo, tais como pH, teores de cálcio e magnésio e saturação por bases na camada arável, persistindo no solo, como efeito residual, por vários anos.

Resultados práticos têm demonstrado que a calagem em soqueiras de cana aumenta a produtividade e expande a vida útil do canavial em, pelo menos, mais um corte, sendo suficiente para viabilizar economicamente essa prática. A calagem em soqueira também contribui para manter o subsolo em melhores condições para o desenvolvimento da cana-planta na reforma do talhão

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